quarta-feira, 12 de setembro de 2018

Sobre o autor Carlos Filipe Gonçalves - Programa Código de Vida difundido na Televisão de Cabo Verde
Programa Código de Vida

sexta-feira, 6 de novembro de 2015

O tambor e raízes africanas das Festas de Romaria
Associado ao tambor e a formas tradicionais com raízes africanas temos o Kolá, típico das Ilhas de Santo Antão e S. Vicente. Curiosidade o tambor está sempre ligado às Festas dos Santos. Em Santiago, a Tabanka tem uma mística africana que mergulha na Religião Católica. Aliás como acontece no Brasil, onde uma mistura do catolicismo e ritos religiosos africanos se expressam nos rituais do Iemanjá, do Candonblé e Macumbas.
Em Cabo Verde, as raízes africanas ligadas ao ritmo do tambor sofreram uma assimilação da religião cristã, devido à evangelização dos nossos antepassados escravos e incorporaram elementos da cultura europeia (rituais das Festas dos Santos). Por isso nestas Festas, o tambor não louva ou evoca entidades e deuses pagãos do nosso continente. Nestas Festas o “ritmo do tambor” louva o S. João, S. Filipe, S. Pedro, Santa Cruz... A dança, que nosso continente acompanhava esses rituais desapareceu quase por completo, por ser contrária aos costumes cristãos. O Torno – rebolar sensual das ancas é um exemplo que ficou. Como reminiscência dessas danças do continente africano, temos ainda o Kolá (de que resta a umbigada) cuja origem ainda carece de mais explicações.
Não há dúvida que o Batuque e estes ritmos poderão ter uma mesma origem. Apenas o Batuque persistiu e resistiu à assimilação completa conservou a dança e não incluiu elementos da religião cristã. Pudera! Em Santiago havia mais probalidades dessa resistência: Ilha maior, com muitos escravos fugidos. Para as outras ilhas (povoadas depois), com certeza que foram enviados escravos mais dóceis, já ladinizados (sem contar com os carregamentos directos é claro). A grande verdade é que dessa mistura do europeu e do africano nasceram estas formas de música e ritmos tipicamente nossos, cabo-verdianamente como o Kola. (Texto difundido em 29.MAR.87).
 O tambor na música de Cabo Verde é um instrumento tradicional, confeccionado artesanalmente e com uma técnica tradicional muito boa: peles curtidas (em geral pele de cabrito), cordas para esticar e afinar, casco de madeira ou de metal (lata), este o material mais utilizado.
A forma é do tambor europeu. Recorde-se, tanto o tambor europeu com este híbrido cabo-verdiano, são parentes em primeiro grau dos tambores africanos. A origem deste instrumento de percussão remonta à antiguidade... existe desde a pré-história.
O tambor em Cabo Verde está bastante difundido, é popular em todas as ilhas, onde existem formas e modos peculiares para sua utilização. Existem três pólos diferentes quanto à utilização do tambor: em Santiago e no Maio na Tabanka, no Fogo no Pilon e Canizade (Festas da Bandeira), na Brava (Festas de Santos), e em S. Vicente, Santo Antão, S. Nicolau e Sal, no Kolá (também Festas de Santos). (Texto Difundido no prgrama Bom Dia Cabo Verde 26.MAR.87).
No essencial, estas Festas dos Santos nas Ilhas de Barlavento incluem uma parte profana com o toque de Tambores (do tipo europeu), as “Coladeiras” (mulheres que cantam e dançam) e o ritual do “Mastro”. A parte religiosa inclui a missa e a procissão. Vê-se pois que estas festas são muito semelhantes no seu fundamento com as da Ilha do Fogo embora sem o longo e complexo ritual destas.

As Festas de Romaria ou dos Santos Populares duram pelo menos três dias, e conforme a ilha onde se realizam notam-se ligeiras diferenças nos rituais profanos. No geral, nos dias que antecedem o festejo do Santo, realizam-se actividades recreativas e desportivas, confeccionam-se doces e bolos, prepara-se o milho e matam-se os animais (leitões, galinhas, cabras e capados) para a preparação dos pratos para o banquete do grande dia. Note-se que os rituais de Matança ou do Pilon, reminiscências da longínqua mãe África, desapareceram nas ilhas de Barlavento. Isso deve-se, talvez à repressão sistemática feita pelas autoridades religiosas e outras, bem como pelos próprios patrões. 

sexta-feira, 4 de abril de 2008

Tabanka
A Tabanka, é uma forma de música (com ritmo próprio de tambor, cânticos e apitos em búzios), com dança e desfile. Tabanka é sobretudo uma associação de entreajuda, uma manifestação de caracter místico e religioso.
Como as outras manifestações das outras ilhas em que aparece o tambor, os Festejos da Tabanka, desenrolam-se entre Maio e Junho. A Tabanka, não é só musica... Tabanka é toda uma vida social que se entrelaça no dia a dia, é uma espécie de religião, é a ajuda mútua entre as pessoas (pagamento de quotas para ajuda na vida e na morte). Tabanka também gira à volta de comezainas e da cozinha tradicional... enfim, é todo um ritual complexo, e um tabu para os que a ela não pertencem.
Na Tabanka, há toda uma estrutura social e militar, que prefiguram a vida real: Rei, Rainha, Cativos, Juiz, Carcereiros, Ladrões.... Há uma representação imaginária da vida real e durante os festejos vive-se numa realidade virtual...
Mistura de música, culto, sociedade paralela com regras próprias (algumas muito rígidas), a Tabanka é uma manifestação riquíssima, que existe desde os tempos idos dos finais da escravatura. Existe nas Ilhas de Santiago e do Maio.

quinta-feira, 13 de março de 2008

Batuque
Batuque é porventura, a forma de música tradicional que mais define as nossas raízes. Segundo a definição de vários autores e estudiosos, o Batuque começa com um canto, que se chama Finaçon. Também pode haver uma introdução pela Cimboa – este, um instrumento característico de Cabo Verde, que é o atestado do nosso parentesco em primeiro grau com a Cultura da Costa Ocidental da África.
Hoje, Batuque, Finaçon e Cimboa estão em vias de extinção. Do Finaçon, apenas nos restaram os ecos do que era, pelas vozes e improvisações de Bibinha Cabral e Nácia Gomes. Felizmente o Tomé (Varela) fez a recolha na hora certa. O último genuíno tocador de Cimboa já morreu! E este instrumento passou a ser uma peça decorativa de salas de visita, onde recorda uma longínqua ligação com a mãe África.
O Batuque Cabo-verdiano é característico e específico do Arquipélago. Embora parecido com outras formas musicais do continente africano, tem a sua linha própria. Em comum, com as formas homólogas do continente tem: o lançamento do tema musical, seguido de improvisação colectiva, às vezes com o solista em destaque e momentos de êxtase profundo. Uma curiosidade: essa característica africana, de apresentação do tema seguido de improviso (muitas vezes colectivo), perdura ainda hoje na música negra norte-americana. Esta é a característica fundamental do Jazz! (Dif. B.D.C.V. 25.MAR.87).

segunda-feira, 10 de março de 2008

Introdução

Ser ou não Ser

A musica de Cabo Verde, não é constituída apenas pelas Mornas e Coladeiras. Também fazem parte da musica de Cabo Verde, o Batuque, o Funaná, a Tabanka, o Kolá, com os seus ritmos e respectivos cânticos, melodias e ritmos. Musica de Cabo Verde, são também os diversos cânticos relacionados com as mais diversas actividades: as Divinas, as Rezas, Cantigas de Trabalho e outras que fazem parte do que podemos chamar, musica com uma função social determinada.

Musica de Cabo Verde são também as Mazurcas, Valsas, Polcas, Sambas e outros géneros que são praticados pelos nossos músicos. Embora originários da Europa ou da América, já fazem parte do Património Cultural de Cabo Verde, uma vez que foram adoptados e estão tão intimamente ligados à vida do cabo-verdiano com o estão como a Morna ou a Coladeira.

Musica de Cabo Verde, é também o conjunto de géneros musicais nascidos de simbioses com outros géneros do Património Musical Universal. Hoje temos Musica Clássica ou Jazz. Musica de Cabo Verde é também aquela que nasce da inspiração espontânea dos nossos músicos e compositores e que traduz o sentimento e alma cabo-verdiana.

Na musica de Cabo Verde, utilizam-se tradicionalmente os mais dispares instrumentos: do violino tipicamente europeu à Cimboa, tipicamente africana. E pelo meio, um espectro de instrumentos, que engloba, o violão, violino, cavaquinho... clarinete, saxofone... piano!.. O domínio da percussão, vai dos tambores tradicionais à bateria e hoje inclui quase todos os instrumentos de percussão conhecidos.

No seu conjunto, musica de Cabo Verde, é um sector difícil de delimitar. Muita controvérsia tem sido gerada a propósito, porque a tendência natural é a compartimentação da musica em géneros e modalidades específicas. Para isso já se utilizaram vários critérios: autenticidade, "raízes da terra", razões históricas, geográficas etc. É com base nestes critérios e outros que geralmente, e muitas vezes, o senso comum põe em causa certas ousadias musicais... ou exclui e menospreza este ou aquele tipo de musica. Peremptoriamente diz-se: isso não é musica de Cabo Verde! Ou então: isto é folclore!

Conforme a Ilha ou grupos de Ilhas, assim temos um género tradicional e específico. Houve tempos que muitos habitantes de uma ilha, desconheciam ou não tinham uma ideia precisa dos géneros musicais, existentes em outra. E talvez ainda hoje exista até certo ponto esse desconhecimento. Isso tem levado a essa compartimentação de que falamos e logo a diversos conceitos do que é musica de Cabo Verde. E conforme os tempos assim são as vontades... No tempo Colonial, Mornas e Coladeiras eram consideradas "Folclore" ou "Musica Típica"... Na rádio dizia-se com uma certa ousadia "Musica da nossa Terra"! Nessa época, o Batuque, o Kolá ou a Tabanka eram consideradas formas exóticas, coisas do povo... nem classificação mereciam! De Badjo Gaita, Ferrinho ou Funaná, nem se ouvia falar.

Com a Independência Nacional, o termo folclore desapareceu. As Mornas e Coladeiras ascenderam ao estatuto de musica de Cabo Verde e musica nacional. O hoje tão prestigiado "Pau e Corda", passou a ter a designação de "Musica Típica". O Batuque, a Tabanka, o Kolá, passaram a ser considerados e ascenderam à categoria de "manifestação cultural"! O Ferrinho ou Funaná passou a ser conhecido e respeitado. O debate sobre o Funaná ocorrido nos princípios dos anos 80, mais não foi que o fruto de muitos equívocos e falta de conhecimento de nós mesmos.

Afinal, quem somos? Parece pacífica a definição: um povo de misturas, produto inegável de um encontro de culturas. É pois natural que em Cabo Verde, existam os mais díspares géneros de musica... desde o Batuque com raízes africanas (onde ainda perdura de forma simulada o tam-tam dos nossos antepassados escravos) até às valsas de cunho marcadamente europeu. Não é pois de estranhar que hoje tenhamos musica com raízes nos dois entremos que são Musica Clássica ou o Jazz e pelo meio um espectro de géneros musicais, de denotam influências das mais variadas latitudes. Portanto musica de Cabo Verde tem largos horizontes... Musica de Cabo, é tudo aquilo que no campo da arte dos sons seja feito pelo cabo-verdiano. (M.S.M, 1978 revisto para KB Junho 1988).